Economia
Lula corta mais e Bolsa Família vai ao menor nível em 3 anos
855 mil famílias saíram do programa em julho e agora 19,6 milhões recebem o dinheiro; governo fala em “aumento de renda', mas recuo tão grande é incomum
BATANEWS/PODER360
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) intensificou nesta 2ª metade de 2025 o pente-fino que vem fazendo no Bolsa Família. De junho para julho, 855 mil famílias deixaram de receber o auxílio. Essa baixa foi a maior em um só mês da história do programa social.
O discurso oficial do Ministério do Desenvolvimento Social é que a maior parte dessas pessoas saiu do Bolsa Família porque aumentou de renda. Só que é muito incomum que um corte dessa magnitude ocorra de forma orgânica.
O programa social tem uma movimentação intensa. Todo mês várias famílias deixam de receber e muitas outras entram. O saldo fica normalmente perto de zero nos números gerais de pagamento, com leves variações para cima e para baixo.
Ainda não é possível saber o que causou tamanha queda no número de beneficiários em julho. Tudo indica que foi feito um intensivo para bloquear cadastros que estão irregulares por algum motivo e atrasar outros que poderiam começar a receber.
O Bolsa Família beneficia hoje 19,6 milhões de famílias. Quando Lula assumiu, eram 2,3 milhões a mais.
Como mostra o quadro acima, o corte de 855 mil cadastros levou o Bolsa Família ao menor patamar em volume de inscritos desde julho de 2022, na administração de Jair Bolsonaro (PL).
Pouco antes da eleição, o ex-presidente inflou o programa social de forma inédita e incluiu dezenas de milhares de pessoas para tentar aumentar sua popularidade.
Esse movimento da administração anterior impulsionou os gastos gerais com o programa. Em janeiro de 2022, o Bolsa Família (que se chamou Auxílio Brasil por um tempo) custou R$ 3,7 bilhões mensais, em valores nominais. No fim daquele ano, o gasto mensal havia subido para R$ 13 bilhões.
O pico de gastos com o Bolsa Família foi em junho de 2023: R$ 15 bilhões. Os custos depois disso se estabilizaram perto dos R$ 14 bilhões. Agora, parecem ter entrado em trajetória de queda:
O corte no Bolsa Família era necessário porque o Orçamento de 2025 só autoriza R$ 158,6 bilhões em gastos com o programa. Em 2024, foram empenhados R$ 168,2 bilhões, segundo o Siga Brasil. Com menos recursos, menos pessoas poderão ser atendidas.
O Ministério do Desenvolvimento Social disse ao Poder360 que parte da baixa de cadastros se deve à modernização do sistema do Cadastro Único e à fiscalização mais efetiva:
“O cruzamento de dados das bases do governo federal, como o CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais), se tornou mais eficiente. Um exemplo desta integração é que as informações de renda das famílias passam a ser atualizadas automaticamente', afirma o órgão. Leia a íntegra da nota no fim desta reportagem.
Segundo o governo, o pente-fino excluiu 8,6 milhões de famílias do programa social desde 2023. Os motivos dessas exclusões não são conhecidos.
Em abril deste ano, 473 mil famílias estavam pré-habilitadas para entrar no Bolsa Família. Tudo indica que essa fila vem sendo segurada pelo governo. Os dados mais recentes ainda não estão disponíveis.
O Poder360 mostra desde o início de 2025 uma série de indícios de irregularidades no programa:
O governo diz estar atento, mas a fiscalização ainda é lenta.
Eis a nota enviada pelo Ministério de Desenvolvimento Social:
“Cerca de um milhão de domicílios deixarão de receber o benefício do Bolsa Família em julho, por terem aumentado a renda. A maioria delas, 536 mil, cumpriu 24 meses na Regra de Proteção. Elas atingiram o prazo máximo de recebimento de 50% do valor a que têm direito, por terem alcançado uma renda per capita entre R$ 218 e meio salário-mínimo.
“Esse público ainda é protegido por outra medida: o Retorno Garantido. Ela é aplicada quando a família que ultrapassou o período de 24 meses na Regra de Proteção ou solicitou o desligamento voluntário do programa volta à situação de pobreza. Nestes casos, os antigos beneficiários têm prioridade para voltar a receber o Bolsa Família.
“Além das famílias que deixam o programa por atingirem o prazo máximo na Regra de Proteção, outros 385 mil domicílios ultrapassaram R$ 759, meio salário mínimo, de rendimento por pessoa em julho. Elas tiveram um aumento de renda maior que o limite da Regra de Proteção.
“Com a modernização do sistema do Cadastro Único, realizada em março, o cruzamento de dados das bases do Governo Federal, como o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), se tornou mais eficiente. Um exemplo desta integração é que as informações de renda das famílias passam a ser atualizadas automaticamente.
“A novidade é mais uma etapa dos esforços do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), que desde 2023 vem qualificando as informações do Cadastro Único. Como resultado, somadas as saídas de julho de 2025, aproximadamente 8,6 milhões de famílias deixaram o Bolsa Família.
“Regra de Proteção
“A medida foi uma das novidades do novo Bolsa Família, retomado há dois anos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O programa de transferência de renda condicionada é referência mundial e uma das políticas públicas que integram o colchão social para as famílias em vulnerabilidade, como destacou o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Wellington Dias.
““Em conjunto com a retomada dos investimentos e reestruturação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), com a volta de políticas de segurança alimentar e nutricional, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Cisternas, e com a criação de uma estratégia nacional de combate à fome, o Brasil Sem Fome, o Bolsa Família promoveu a saída de 24,4 milhões de pessoas da insegurança alimentar grave, apenas em 2023. A expectativa é que até 2026, esse número seja reduzido ao ponto de o país sair novamente do Mapa da Fome, como ocorreu em 2014', projetou o titular do MDS.
“Em 2024, do total de vagas formais de emprego criadas, 98,87% foram ocupadas por pessoas inscritas no Cadastro Único e 75,5% pelo público do programa de transferência de renda. No ano passado, 50% da população do país estava na classe média – renda individual de R$ 3,4 mil ou mais -, incluindo 972 mil pessoas registradas no CadÚnico.
“Em 2023, o índice de pobreza e extrema pobreza no Brasil alcançaram os menores patamares em anos, chegando a 27,4% e 4,4% respectivamente, segundo dados do Banco Mundial.
“Novas regras
“Com a economia em recuperação e o mercado de trabalho formal em crescimento, o Governo Federal atualizou as regras de transição para as famílias beneficiárias do Bolsa Família que passam a ter recebimentos acima do limite de entrada no programa.
“Julho é o primeiro mês de aplicação das novas regras, que alcançam cerca de 36 mil famílias. Elas tiveram um aumento de renda entre R$ 218 e R$ 706 per capita e entraram na Regra de Proteção. Nestes domicílios, o grupo familiar recebe 50% do valor a que tem direito, por até 12 meses.
“A fixação do novo limite de renda está alinhada à linha de pobreza internacional, estabelecida a partir de estudos sobre a distribuição de renda em diversos países do mundo.
“Além disso, as famílias cuja renda seja considerada estável ou permanente – como aquelas que recebem aposentadoria, pensão ou Benefício de Prestação Continuada (BPC/Loas) – poderão permanecer com o auxílio do Bolsa Família por até dois meses. Nesses casos, já há uma proteção social contínua assegurada pelo Estado, o que contribui para maior previsibilidade ao orçamento familiar.
“Cabe destacar, entretanto, que no caso de famílias com pessoas com deficiência que recebem o BPC, o tempo máximo de permanência na Regra de Proteção será de 12 meses. A atenção diferenciada considera que o benefício, em seu regramento, passa por revisões periódicas em se tratando de pessoas com deficiência'.