Era noite de domingo quando a van encostou no campo de Jardim Peri Alto, Zona Norte de São Paulo, intensificando o movimento durante o som de uma banda de pagode na comunidade. Em vez de Gabriel Jesus, porém, que virou quase rotina por ter crescido na área, a chegada era de uma visita inesperada: Xavi Simons, meia-atacante do RB Leipzig e da seleção holandesa.

– Era um dos meus sonhos, experimentar essa cultura – explica Xavi, em entrevista exclusiva ao ge.

Carregando as letras "BR" na cabeça, desenhadas nas tranças nagô, ele está no Brasil para a disputa do amistoso contra o Santos, nesta quarta, e aproveita a viagem para conhecer as raízes do país, realizar sonhos e reencontrar conselheiros de vida.

Entre eles, Memphis e Neymar, seu ídolo de infância.

Fruto da La Masia, nome dado às categorias de base do Barcelona, Xavi tinha apenas 11 anos quando encontrou Neymar, então atleta do clube catalão, pela primeira vez.

Ainda era jovem para dividir os gramados, mas em 2019 seguiu os passos do ídolo, transferindo-se do Barcelona ao Paris Saint-Germain, onde estreou como profissional. Era tratado por Neymar como se fosse um filho. E é dessa época que Xavi guarda as melhores memórias com o brasileiro.

– Ele que estava cuidando de mim no PSG. Sempre lembro o que ele disse para mim: "Não tenha medo de nada, só vá e jogue futebol". É assim que eu olho o futebol também, estou realizando meu sonho de criança e essa é a coisa mais importante para mim.

Eles conversaram por mensagem antes mesmo da chegada da delegação ao Brasil e se encontraram na segunda-feira à tarde, durante uma visita ao Instituto Neymar Jr em Praia Grande, no litoral de São Paulo.

Enquanto Neymar pavimentou os passos de Xavi ainda menino no PSG, na seleção da Holanda contou com outro mentor. Ele vinha sendo convocado desde a base e viveu o ápice em 2022, aos 19 anos, quando foi à Copa do Mundo e se tornou o mais jovem a jogar pela equipe em fase decisiva de Mundial.

Eles estarão juntos mais uma vez, inclusive, nas Eliminatórias da Copa, em que a Holanda enfrenta Finlândia e Malta, nos dias 7 e 10 de junho, quando Memphis deixa o Corinthians durante a Data Fifa entre as 11ª e 12ª rodadas do Brasileirão.

– Você pode ver que ele está tentando construir algo aqui no país, talvez para as próximas gerações que queiram jogar no Brasil. Eu diria que ele é um dos que abriu essa porta. Vi que ele ganhou um troféu com eles, fico feliz, espero que ele possa ganhar mais títulos também.

Berço de Gabriel Jesus: churrasco na comunidade

Desde que chegou ao Brasil, Xavi tem cumprido com obrigações da programação do RB Leipzig, mas faz questão de realizar algumas suas também.

A visita ao campo da comunidade de Jardim Peri Alto, no domingo, era uma delas. De família originada no Suriname, que faz fronteira com o Brasil, Xavi enxerga similaridades culturais, carrega a música brasileira em sua rotina e queria ver de perto o futebol jogado na rua em São Paulo.

Andressa Oliveira, que mora na região e havia voltado do trabalho, estava no campo quando a equipe do jogador chegou trazendo sanduíches, refrigerantes e churrasco para as crianças na comunidade. Terminou ficando para ajudar.

– Comecei a ajudar eles a arrumar o freezer, com refrigerante, água. As crianças ficaram encantadas. Ele ainda pegou uma bola nova que eles trouxeram, chutou para o alto para quem pegasse – conta Andressa.

Passou cerca de 40 minutos no local, conta Joel Silva, morador do Peri e que se descreve como amante do futebol. Conheceu instalações do campo, vestiário, a sede da ONG Garotos de Ouro e tirou fotos com as crianças e até mesmo adultos no local.

– Aproveitei a oportunidade e consegui tirar com meu primo também. Pelo que percebi ele não fala a nossa língua, mas muito humilde, gentil, atencioso. Achei bacana a forma que ele tratou todos aqui – conta Joel.

Xavi esteve acompanhado de sua equipe, incluindo o irmão Faustino Simons, e vestia a camisa do Brasil durante a visita ao bairro Jardim Peri, conhecido por ser o berço de Gabriel Jesus, atualmente no Arsenal. O holandês diz que sabia da conexão. Queria viver de perto o futebol de rua do Brasil.

– Você pode ver as crianças, mesmo não tendo tudo, com um sorriso no rosto, podendo jogar futebol nas ruas, comer algumas comidas, isso que faz a vida bonita. Talvez na Europa às vezes nos falta isso – relata Xavi.